Milena Romano, presidente da empresa de ônibus elétricos Eletra. Foto: Duvulgação/Eletra.
Presidente da empresa de ônibus elétricos Eletra, Milena Romano tem um olhar positivo sobre o futuro da mobilidade no país. “O Brasil está uma década atrasado na eletromobilidade em relação aos países mais avançados, mas estamos recuperando o tempo perdido”, disse a executiva, em entrevista exclusiva ao Canal VE.
Com 22 anos no mercado, a empresa de São Bernardo do Campo (SP) tem o objetivo de ser a maior e mais versátil montadora de ônibus elétricos da América Latina. E, segundo Milena, a Eletra está preparada para atender à demanda por eletrificação de frotas de transporte público em qualquer cidade do Brasil ou do exterior.
“O Brasil já tem uma sólida cadeia produtiva de eletromobilidade no transporte público, formada por empresas instaladas em território nacional, capazes de fabricar veículos modernos, com tecnologia brasileira”, afirmou.
Um dos exemplos é o e-Bus 12,1m, apresentado oficialmente ao público brasileiro em Brasília (DF), no dia 7 de março de 2023, durante o Congresso da Mobilidade e Veículos Elétricos do Distrito Federal, o C-MOVE Brasília.
É um ônibus elétrico inteiramente produzido no Brasil, com tecnologia nacional e participação de algumas das principais empresas de transporte público sustentável do país, como Caio, Mercedes-Benz e WEG.
Participação em painel
No Dia Internacional da Mulher, em 8 de março de 2023, a executiva participou de um painel do C-MOVE Brasília, sobre o papel das mulheres na eletrificação e no poder público.
Luciane Canha, pesquisadora da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), e Rita Mazzuchini, especialista em comunicação corporativa, acompanham Milena no painel.
Para Milena Romano, “as mulheres decididas, confiantes e profissionalmente bem preparadas podem atingir postos de comando em qualquer tipo de empresa”.
Confira a entrevista completa
Canal VE: Como presidente de uma empresa de ônibus, uma indústria tida como predominantemente masculina, você incentiva outras mulheres a assumirem papéis de liderança em suas organizações. Quais obstáculos teve de enfrentar para chegar a essa posição e como superar essas questões?
Milena Romano: Francamente, hoje em dia não acredito que ainda haja setores empresariais “predominantemente masculinos”. Não acredito em machismo estrutural. Não existe nenhuma empresa moderna, verdadeiramente orientada por resultados, com uma plaquinha na porta escrito: “menina não entra”.
Também não somos uma ditadura teocrática. Hoje, as mulheres têm as mesmas oportunidades que os homens para entrar em qualquer curso técnico ou superior e, uma vez formadas, exercer a profissão que escolheram.
Isso não significa que conseguirão. Significa que terão as mesmas oportunidades. E, em alguns casos, talvez até alguma vantagem. Penso especialmente em profissões com crescente participação feminina, como relações públicas, recursos humanos, jornalismo, odontologia, TI, arquitetura, economia e até medicina.
Mulheres decididas, confiantes e profissionalmente bem preparadas podem atingir postos de comando em qualquer tipo de empresa. A luta para chegar lá e continuar no topo será árdua, como para qualquer homem. Mas é um caminho aberto a quem tenha talento, persistência e competência. Essa regra vale para homens e mulheres.
Além disso, as leis brasileiras proíbem qualquer tipo de discriminação sexual. A Constituição é clara a esse respeito, e a Lei 9.029/1995 é ainda mais explícita. Qualquer mulher que puder demonstrar a existência de barreiras ou abusos de natureza sexual no mercado de trabalho deve exigir seus direitos, pois terá os tribunais a seu favor.
Isto posto, isso não significa que não existam comportamentos machistas. Claro que existem. Mas estes estão em declínio, assim como as empresas que ainda o praticam.
Hoje, você representa uma voz atuante e respeitada nesse mercado. Qual é o papel das mulheres para fortalecer a eletrificação do transporte no Brasil?
Em minha empresa, a liderança é exercida por mulheres. O mesmo ocorre com o grupo empresarial à qual ela pertence, que foi fundado há mais de um século. Por consequência, outras mulheres também exercem cargos importantes nessas empresas. Temos uma longa cultura de valorização da competência das mulheres.
Cabe ressaltar que mulheres têm assumido crescentemente postos de liderança em outras empresas do setor. E não só nas indústrias de ônibus e equipamentos, mas também nas próprias operadoras de transporte público.
Também nessas empresas existe uma mudança de geração, que estimula a presença feminina. Acredito que temos um papel importante na revalorização de todo o sistema de transporte público no Brasil.
Nossa tarefa é batalhar pela inovação em nossos produtos e processos e pela humanização das relações entre os passageiros e os prestadores de serviço. Temos de saber ouvir os nossos clientes e oferecer a eles um transporte de mais qualidade. Tenho certeza de que as mulheres liderarão esse novo momento do setor.
Estamos vivendo um momento em que a eletrificação é tema primordial de qualquer sistema de transporte urbano no Brasil. Quais são os desafios da indústria para atender a demanda por ônibus elétricos nas cidades?
Ainda estamos numa fase de conquista da confiança dos operadores e das autoridades públicas. O Brasil está uma década atrasado na eletromobilidade, em relação aos países mais avançados, mas estamos recuperando o tempo perdido.
A Eletra e outras empresas, como WEG, Caio, Mercedes-Benz e Scania, estão conseguindo provar que a indústria brasileira já tem todas as condições de entregar os ônibus necessários à eletrificação das frotas no Brasil e na América Latina.
Até recentemente, muitas autoridades de transporte e mesmo alguns empresários do setor ainda não tinham se dado conta de que o Brasil já tem uma sólida cadeia produtiva de eletromobilidade no transporte público, formada por empresas instaladas em território nacional, capazes de fabricar veículos modernos, com tecnologia brasileira.
O exemplo da capital paulista, que recentemente proibiu a aquisição de ônibus movidos a diesel, para fortalecer a presença de elétricos, pode incentivar outras cidades a adotarem medidas similares?
Essa decisão da Prefeitura consistiu apenas no estrito cumprimento da Lei 16.802, de janeiro de 2018, que tornou obrigatória a transição das frotas a diesel para veículos de baixa emissão na cidade de São Paulo.
A Lei 16.802, sim, foi muito importante. Ela fixou um prazo obrigatório de 20 anos para a eliminação gradual de todas as emissões de CO2 e de 95% das emissões de óxidos de nitrogênio (NOx) e de material particulado (MP) da frota paulistana.
Ao mesmo tempo, a Prefeitura lançou uma licitação para renovar os contratos com as empresas de ônibus, com base naquelas metas. A licitação deu um passo à frente em relação à lei, ao estabelecer limites anuais obrigatórios de emissões das operadoras. Essas metas, especialmente, as de CO2 só poderão ser atendidas com ônibus elétricos.
O processo todo envolve a transição de 14.400 ônibus – a maior frota municipal de transporte público do Ocidente e a terceira maior do planeta. O sucesso da lei paulistana, portanto, terá um impacto imenso nas principais cidades do Brasil. Aliás, já está tendo. Salvador, Vitória, Curitiba e outras são exemplo disso.
A Eletra está expandindo sua participação em diversas capitais, como São Paulo, Brasília, Salvador e outras. Quais os planos da empresa para o futuro?
Nosso objetivo é muito claro. A Eletra está se preparando para ser a maior e mais versátil montadora de ônibus elétricos da América Latina.
Em 2022, começamos a lançar uma nova linha de veículos, que poderá atender às exigências de eletrificação de frotas de qualquer cidade brasileira ou do continente.
São cinco novos modelos do e-Bus Eletra, com dimensões entre 10m e 21,5m. E mais o e-Trol, um ônibus elétrico com um inovador sistema de recarga de baterias, desenhado especialmente para corredores segregados e BRT.
Todos esses veículos são fabricados com tecnologia de tração elétrica Eletra, em parceria com empresas de sólida tradição em eletromobilidade e transporte público no Brasil, como WEG, Caio, Mercedes-Benz e Scania.
A Eletra também investiu numa nova área industrial de 27 mil m² no Km 16 da Via Anchieta, em São Bernardo do Campo (SP), onde poderá fabricar até 1.800 ônibus elétricos/ano, ou 150/mês.
Enfim, temos 22 anos de experiência em inovação e muita determinação de levar a eletromobilidade às principais cidades do Brasil e do continente, com veículos modernos, seguros, customizados e adaptados às condições reais de operação.
Jornalista graduado pela PUC-Campinas. Atuou como repórter, redator e editor em veículos de comunicação de grande circulação, como Grupo Folha, Grupo RAC e emissoras de TV e rádio. Acompanha o setor de veículos elétricos e outras energias renováveis para o desenvolvimento sustentável.