Fórmula E é um laboratório para o futuro da mobilidade elétrica. Foto: Divulgação/Fórmula E.
Desde que estreou em 2014, o Campeonato Mundial de Fórmula E tem sido muito mais que um campeonato de corridas de carros elétricos: é um grande laboratório vivo para o desenvolvimento de tecnologias que hoje já fazem parte do cotidiano dos usuários de veículos elétricos no mundo todo.
Inovações tecnológicas testadas e desenvolvidas pela categoria nas pistas já migraram para as ruas, moldando o rumo da mobilidade elétrica urbana. Não à toa, a expansão do mercado de carros elétricos, com mais de 40 milhões de unidades em circulação no mundo até 2023, de acordo com a Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês), cresce a cada ano.
Tecnologias como carregamento ultrarrápido, gestão da bateria, conectividade, modos de condução, frenagem regenerativa, aerodinâmica e eficiência dos motores, hoje comuns, passaram por grandes transformações ao longo dos anos nas pistas da Fórmula E. Neste artigo, vamos abordar como a categoria contribui ativamente para o desenvolvimento dos carros elétricos atuais e os das próximas gerações.
1- Revolução da frenagem regenerativa
A frenagem regenerativa, que converte energia cinética em eletricidade nas desacelerações, carregando a bateria para uso posterior na tração do carro, surgiu primeiro na Fórmula 1, garantindo potência extra para os carros. Mas foi na Fórmula E que o sistema Kers (Kinectic Energy Recovery System, ou Sistema de Recuperação de Energia Cinética) evoluiu, desde a primeira temporada, com o carro Gen1, até aqui.
Se em 2014, na estreia da Fórmula E, os pilotos precisavam competir com dois carros, fazendo um pit stop no meio da corrida para, literalmente, sair de um carro sem energia e entrar em outro carregado, hoje o carro Gen3 EVO, que estreia na 11ª temporada da competição, tem capacidade de 600 kW de frenagem regenerativa, gerando quase 50% da energia necessária para uma corrida, durante a própria corrida.
Nos carros de passeio, o sistema Kers é usado para aumentar a autonomia e a eficiência, permitindo que os modelos recuperem a energia das frenagens para a bateria, em diferentes níveis, conforme a necessidade do motorista.
2- Motores elétricos mais potentes e eficientes
Os motores da Fórmula E também se desenvolveram desde a estreia da categoria, e hoje alcançam eficiência superior a 90%, enquanto os motores a combustão interna geralmente não passam de 40%. A tecnologia é aplicada nos motores dos carros elétricos de passeio, garantindo maior desempenho nas ruas.
E a partir desta temporada, o Gen3 EVO também terá tração integral em momentos-chave, como nas voltas de classificação, na largada e durante o modo ataque garantindo potência extra para o conjunto. Capaz de acelerar de 0 a 100 km/h em 1,86 segundos (ou 0-60 mph em 1,82 s), o novo carro é 36% mais rápido que a versão anterior, o Gen3, e cerca de 30% mais rápido em aceleração do que um carro atual de Fórmula 1.
3- Gestão de baterias
Em dez temporadas disputadas até aqui, a Fórmula E aprimorou os sistemas de gerenciamento de baterias (BMS), garantindo maior durabilidade e desempenho, mesmo em condições extremas.
Os saltos tecnológicos foram visíveis de uma temporada para outra, em especial nas atualizações dos carros (Gen1, Gen2, Gen3) — vide as trocas de carros durante as corridas no início da categoria. Agora, a gestão das baterias é decisiva para as últimas voltas das corridas, e o Gen3 EVO deve representar mais um passo em direção à maior eficiência dos carros.
Esse avanço é crucial para carros elétricos modernos, que dependem de uma gestão eficiente para suportar carregamentos rápidos e otimizar a vida útil das baterias, que também estão suportando mais energia para garantir maior autonomia no dia a dia.
4- Aerodinâmica e sustentabilidade
Se as baterias garantem a energia, a aerodinâmica dos carros da Fórmula E sempre teve como foco a redução e a melhor eficiência do consumo energético nas corridas. Além disso, o Gen3 incorporou materiais sustentáveis, como fibras naturais e recicladas.
O Gen3 EVO passa a contar com um novo kit de carroceria, projetado para ser mais forte, robusto e aerodinâmico, promovendo corridas mais próximas entre os pilotos, com ainda mais ultrapassagens durante as etapas.
Outro ponto a ser observado nos carros atuais é o pneu, com 35% de materiais reciclados (9% a mais que a especificação da temporada anterior), garantindo ainda mais aderência nas pistas.
Essas inovações também estão presentes nos carros de passeio, com designs mais aerodinâmicos para diminuir o arrasto, e uso de materiais reciclados nas construções.
5- Modo de ataque
O Attack Mode é uma atração à parte da Fórmula E. Introduzido no carro da segunda geração, o Gen2, o modo de ataque permite aos pilotos usar potência extra por um período limitado, aumentando a estratégia nas corridas.
Na 11ª temporada, o Attack Mode ganhará ainda mais importância, já que o Gen3 EVO ganhará tração nas quatro rodas, maximizando a aceleração e o controle.
Traduzindo o conceito para os carros de passeio, o modo de ataque seria o equivalente ao modo de condução “Sport”, quando o motorista prioriza o melhor desempenho do carro elétrico, em detrimento ao modo “Eco”, que tem a maior eficiência como prioridade.
6- Carregamento ultrarrápido
Com carros elétricos super eficientes, o desenvolvimento da tecnologia de recarga não poderia ficar para trás. Desde a terceira geração, Gen3, a ABB, parceira oficial da Fórmula E, desenvolveu o ABB Formula E Race Charger, projetado de forma robusta, personalizada e ergonômica para permitir fácil transporte e instalação em todo o mundo, levando em consideração as diferenças encontradas em cada país no fornecimento de energia elétrica.
O carregador, com 160 kW de potência máxima, era capaz de carregar os dois carros da mesma equipe simultaneamente, diminuindo a pegada de carbono nos transportes dos carregadores pela metade.
A nova geração de carros da Fórmula E será capaz de receber recargas ultrarrápidas, durante as sessões de treinos e até mesmo nas corridas, garantindo energia extra em poucos segundos.
Os carros de passeio também se beneficiam das recargas ultrarrápidas, em especial em eletropostos instalados em rodovias. Os carros atuais já contam com dispositivos com capacidade para receber recargas em corrente contínua (DC) e potência elevada em poucos minutos. Alguém duvida do avanço dessa tecnologia para os próximos anos?
7- Conectividade e telemetria
Os sistemas de telemetria da Fórmula E fornecem dados em tempo real para pilotos e equipes, otimizando o desempenho na pista. Com as informações, os pilotos e os mecânicos podem fazer ajustes para garantir melhorias.
Essa tecnologia também foi adaptada para os carros de passeio, permitindo que motoristas monitorem seus veículos por meio de informações na tela multimídia ou em aplicativos dedicados. Assim, dados de consumo de energia ou mesmo pressão e temperatura dos pneus estão ao alcance em tempo real, garantindo a melhor performance nos trajetos.
Outra possibilidade é a conexão com sistemas de inteligência artificial, como Internet das Coisas (IoT) e carros autônomos, possibilitando a revolução na mobilidade urbana como a que conhecemos hoje.
Tecnologia a favor da mobilidade
A Fórmula E não é apenas uma competição automobilística de alto nível, mas também um impulsionador de inovações tecnológicas que transformam a realidade dos carros elétricos no dia a dia, tornando-os mais acessíveis, eficientes e sustentáveis com o passar do tempo.
Isso faz com que, a cada nova temporada, as tecnologias testadas nas pistas ao redor do mundo possam contribuir para a transição energética da mobilidade, garantindo um futuro mais limpo e sustentável para as próximas gerações.
E você, já pensou como a Fórmula E está impactando o seu próximo carro elétrico? A categoria não acelera apenas nas pistas, mas sim no futuro da mobilidade.
Jornalista graduado pela PUC-Campinas. Atuou como repórter, redator e editor em veículos de comunicação de grande circulação, como Grupo Folha, Grupo RAC e emissoras de TV e rádio. Acompanha o setor de veículos elétricos e outras energias renováveis para o desenvolvimento sustentável.