Impostos cobrados no Brasil podem representar mais de 30% do preço do carro. Foto: Divulgação/Freepik.
Ao encomendar um carro elétrico zero quilômetro numa concessionária brasileira, o motorista pode ter dificuldades para entender a conta que faz o veículo ter um preço tão elevado. É que, normalmente, o valor informado não discrimina logo de cara todos os impostos e suas alíquotas que incidem sobre os preços. Também, pudera. São tantos tributos que fica até difícil de entender.
As siglas estão aí: IPI, PIS/Pasep, Cofins, ICMS, IPVA… E ainda tem o imposto de importação, para os veículos fabricados no exterior (no caso dos carros 100% elétricos disponíveis no Brasil, são todos importados). Além dessas, que incidem sobre o produto, ainda há taxas setoriais e encargos pagos em serviços, durante a fabricação.
Somando todos os impostos, diretos e indiretos, dá pra dizer que o valor das taxas que incidem sobre os preços dos carros no Brasil, seja a combustão ou eletrificados, pode representar mais de 30% do que o consumidor paga pelo veículo, mas a conta pode variar bastante para mais que isso. Como comparação, nos Estados Unidos os impostos representam uma média de 6% no preço dos carros.
“Dado o manicômio tributário brasileiro, fica difícil calcular a carga de impostos sobre qualquer tipo de veículo, e no caso dos eletrificados é ainda mais complexo”, afirma Glauco Lucena, gerente de imprensa da Anfavea, Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores.
Os principais impostos diretos são PIS/Pasep e Cofins, ICMS (estadual) e IPI.
No entanto, a base de cálculo de cada um é diferente. PIS/Pasep e Cofins são calculados considerando o preço líquido (custo de produção, lucro do fabricante e os encargos em serviços e taxas setoriais), enquanto o ICMS pode ser cobrado sobre o preço líquido e o preço final. Depois disso, ainda vem o IPI, que tem alíquotas bastante variáveis. O Imposto de Importação também entra na conta. Pensa que acabou? Nada disso. O carro novo precisa de emplacamento, e o IPVA vem para arrematar.
(Confira nosso material audiovisual a respeito do assunto neste link).
Entendendo os impostos
No Brasil, a tarefa de calcular os impostos que incidem sobre os veículos é praticamente impossível, já que as montadoras não apresentam os valores de custo dos carros e a margem de lucro tanto das fabricantes como das revendedoras.
A estimativa de especialistas no setor é que a margem das fabricantes no Brasil fique em torno de 10% do custo (como comparação, a margem de lucro das montadoras nos EUA, por exemplo, gira em torno de 3%, pois lá há uma política de lucro pelo volume de vendas).
Como os impostos agem sobre o preço líquido e também sobre o preço final, a conta varia de veículo para veículo.
Vale destacar que os componentes do carro (bancos, pneus, vidros, etc.) também têm impostos embutidos, o que interfere no preço líquido.
O índice do PIS/Pasep (Programa de Integração Social e Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público) é de 2%, enquanto o do Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social) é de 9,6%. As alíquotas são aplicadas sobre o preço líquido do veículo. As duas contribuições são federais e devem ser pagas por pessoas jurídicas fabricantes e importadoras desses bens (tributação concentrada), enquanto pessoas jurídicas atacadistas e varejistas desses bens são isentas, segundo a Receita Federal.
O ICMS (Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias) varia de estado para estado, de 12% a 18%, conforme o modelo. Em São Paulo, o ICMS é de 14,5%.
O IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) é outro tributo federal que incide sobre o preço do veículo, já somado aos impostos anteriores. O índice varia de acordo com a massa em ordem de marcha (peso do carro em movimento) e a eficiência energética do mesmo. No caso dos elétricos, pode variar de 5,27% a 13,03%.
De acordo com a Receita Federal, “quanto ao IPI incidente produção ou importação de automóveis elétricos (TIPI 8703.80.00), embora inicialmente sejam tributados a 18,81%, são beneficiados por reduções de alíquotas relacionadas com critérios de eficiência energética (não incluídos os veículos que utilizem diesel, mesmo que híbridos), nos termos da NC (87-6) da TIPI/2022 (Dec. 10.979/21, TIPI/2022 em vigor a partir de 1º/04/2022)”.
A tabela do IPI, que inclui carros a combustão (códigos TIPI 8703.40.00 e 8703.60.00) ajuda a esclarecer:
Para veículos a combustão movidos a etanol ou equipados com motores que utilizam alternativa ou simultaneamente gasolina e etanol, há um desconto de dois pontos percentuais.
Veja, a seguir, exemplos de carros a combustão e elétricos e as respectivas alíquotas de IPI conforme a eficiência energética (de acordo com o PBE Veicular 2022, Programa Brasileiro de Etiquetagem para veículos automotivos, do Inmetro) e Massa em Ordem de Marcha (MOM):
Já a alíquota do Imposto de Importação para a NCM 87.03.80.00 (outros veículos, equipados unicamente com motor elétrico) é de 35%, de acordo com a Receita Federal. Como os veículos 100% elétricos disponíveis no Brasil são todos importados, os preços para os consumidores sofrem esse impacto.
Por fim, para tirar o carro da revendedora e circular pelas ruas, o motorista precisa pagar o IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores), que também varia de acordo com o estado. Em São Paulo, a alíquota do IPVA é de 4% para carros de passeio.
Como saber quais impostos estou pagando?
A Lei do Imposto na Nota (Lei nº 12.741/12, de 8 de dezembro de 2012) foi criada com o intuito de informar ao cidadão o quanto representa a parcela dos tributos que paga a cada compra realizada.
Assim, todo estabelecimento que efetuar vendas diretamente ao consumidor final é obrigado a incluir nos documentos fiscais ou equivalentes os impostos pagos, valores aproximados e percentuais.
A lei obriga, inclusive, que todos os fornecedores constantes das diversas cadeias produtivas forneçam aos consumidores, em meio magnético, os valores do Imposto sobre a Importação (II) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), individualizados por item comercializado.
As concessionárias de veículos brasileiras apresentam esses dados nas notas fiscais. Algumas chegam a expor nas lojas as tabelas com os percentuais de impostos embutidos nos preços aos consumidores. Com base no que é divulgado por meio das notas fiscais, é possível afirmar que um automóvel no Brasil pode ter entre 31% e 79% de impostos embutidos no preço.
Comparação de preços
Embora os impostos sejam os mesmos, as alíquotas interferem nos preços dos carros de maneiras diferentes, já que os preços líquidos dos carros são diferentes. Assim, fica impossível fazer a comparação, mesmo que seja entre dois carros da mesma marca.
Um exemplo é o Renault Kwid, que possui o modelo a combustão vendido a R$ 62.990, e o elétrico a R$ 146.990 (preços referentes a outubro de 2022, em São Paulo).
Enquanto o modelo a combustão é fabricado no Brasil, o elétrico é importado. Além disso, segundo a empresa, as tecnologias empregadas nos dois veículos são diferentes, para perfis de públicos diferentes. Logo, os preços líquidos pré-determinados pela montadora — e as margens de lucro — obedecem critérios próprios.
Assim, após a aplicação de todos os impostos (sem considerar a variação dos impostos estaduais), os preços finais aos consumidores não podem ser comparados entre si.
Jornalista graduado pela PUC-Campinas. Atuou como repórter, redator e editor em veículos de comunicação de grande circulação, como Grupo Folha, Grupo RAC e emissoras de TV e rádio. Acompanha o setor de veículos elétricos e outras energias renováveis para o desenvolvimento sustentável.